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domingo, 7 de agosto de 2016

Tempo da falta de tempo.



O que conduz as pessoas sentirem-se prisioneiras do seu tempo? Imagina uma prisão, a delimitação de um espaço físico e como se pode atribuir ao tempo essa condição? Considerando que somos seres autônomos, podemos dirigir nossa vida da maneira que bem entendemos, ou não? O que está por trás deste fenômeno mundial da falta de tempo? Existem várias formas de explicação ou entendimento para esta situação; farei uma reflexão sob o ponto de vista de uma terapeuta ocupacional que se preocupa e dirige seus conhecimentos para entender as ações das pessoas e o uso que fazem do seu tempo.
Em minha dissertação intitulada, Inclusão: lazer e participação social sob o olhar de pessoas com deficiência mental e suas famílias, conduzi meus estudos não para a falta de tempo, mas como o tempo livre é despendido para pessoas excluídas socialmente. Atualmente usa-se a expressão pessoas com deficiência intelectual, houve mudança na nomenclatura científica para este termo, porque de fato dizer deficiência mental implica uma conotação generalizada e hoje se entende que pode haver um déficit intelectual o que não implica possuir outras habilidades. Nesta pesquisa destaquei a importância de atividades de lazer na vida dessas pessoas. Naquele momento minha pesquisa se direcionou para as pessoas com deficiência, mas a questão do lazer, por exemplo, é algo pouco desfrutado na vida das pessoas que relatam sobre a falta de tempo. Passado alguns anos após esta pesquisa, observo que para as pessoas com algum tipo deficiência, sobra tempo e uma das preocupações familiares é de como preencher esse tempo vazio. A ausência de um trabalho seria um dos motivos para o tempo desocupado? Normalmente o discurso é: trabalho o dia todo, estudo, não sobra tempo para essas coisas, no caso lazer, divertimento e muito menos atividade física. As justificativas são muitas, cada um pode dar um motivo, Um dos motivos frequentes inclui à falta de condições financeiras, como se o divertimento só tivesse a analogia por coisas ou situações suntuosas. Tanto para o trabalho quanto para o lazer é necessário que essas atividades tenham sentido, significado, satisfação um senso de prazer e realização. O trabalho geralmente está na condição de um ganho financeiro e muitas vezes as pessoas escolhem profissões com vistas ou na expectativa, de sucesso relacionado a dinheiro. É lógico que todos nós precisamos de dinheiro para viver, mas fazer disso a razão de vida com certeza produzirá insatisfação.
Se for analisar friamente, hoje o divertimento de jovens é passar horas e horas em jogos virtuais, no computador no celular. Geralmente o tipo de jogo é progredir etapas, superar, avançar níveis, pra alcançarem tais passagens, precisam matar vencer e capturar. O propósito de tal divertimento não está na ação do presente, no momento, está lá na frente, no vencer uma competição. E o que isso teria a ver com a falta de tempo? No mundo do divertimento virtual, existe um hiperfoco, uma concentração demasiada em apenas uma atividade, o que acarreta a falta de interesse por outras. Portanto, visto por esse ângulo, não existe falta de tempo, existe falta de interesse por acontecimentos novos. Um ”fazer” novo implica repensar ações, despertar interesses, estimular a vontade, sair da automação, se permitir criar, utilizar a espontaneidade, exercitar a capacidade e a liberdade de escolha. A sociedade parece caminhar cada vez mais para a realização de atividades automáticas e pelo acúmulo de tarefas.
Como já disse no tempo embolado, o acúmulo constante de tarefas às vezes esconde algo e também há uma desorganização geral de como distribuir e ou priorizar tarefas ao longo do dia.
Sob um ponto de vista filosófico, será que a falta de tempo é uma forma de não sentir falta alguma? Perceber que algo falta ou mesmo sentir uma perturbação pode gerar um incomodo do qual não quero resolver ou não vejo saída. E assim não é raro o relato da falta de tempo associado à exaustão, há um desgaste e falta de energia, porque há um esforço para encobrir e não perceber os fatos, muito menos qualquer tipo de sensação.  
No ritmo acelerado que vivemos temos dificuldade para perceber sensações, tanto de prazer quanto de desprazer, as pequenas coisas da vida não são apreciadas e ações mais simples se tornam cada dia menos valorizadas. Isto não significa voltar à idade da pedra, mas prestar atenção que o excesso de trabalho, estudo e uso de tecnologias nos aprisionam no tempo.
Enquanto estamos aprisionados várias coisas acontecem ao nosso redor, na família, na política, na vida como um todo e assim corremos o risco, pela falta de tempo, de não exercer nossa função autônoma. Deste modo o exercício da autonomia pode ser um propulsor para sermos de fato senhores e donos do nosso próprio tempo.



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